quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Surtos Extemporâneos Anticárcere I

"A redução da complexidade da cultura contemporânea[1] a meras leis – matemáticas ou jurídicas, tanto faz: a lógica é a mesma – acaba por apresentar uma simplificação insustentável: quando se trata de enfrentar uma ciência social aplicada como o Direito, cujos fenômenos não podem ser descritos através de fórmulas, corre-se o sério risco de um reducionismo muito próximo da irracionalidade.[2]

Pensar o direito penal como meio para efetivar uma resposta estatal em relação a um evento criminoso não só vai de encontro a toda e qualquer constatação de que o sistema penal não consegue efetivar as suas promessas,[3] como também evidencia o conservadorismo característico da dogmática atinente ao tema. A insistente natureza redentora do direito penal submete os acusados em geral a uma situação injustificável, sustentada apenas pela crença de que a pena poderá "salvar" o criminoso e "curá-lo", colaborando, portanto, para a “sociedade de bem”.

Preconiza, ainda, que, por meio da pena, conseguirá fazer com que o sujeito possa se re: ressocializar, reeducar, reintegrar...[4] Ou seja: é a lógica da resposta única para os mais diversos (e complexos) problemas e conflitos.[5] Independente da variedade dos fatores envolvendo cada crime, a resposta é sempre igual: pena privativa de liberdade.

Como diria Paul Feyerabend, “não há soluções gerais” (In Contra o Método. SP: UNESP, 2007, p. 16): é mais do que necessário admitirmos isso, para que possamos pensar no 'passo adiante', sob pena de mantermos essa mesmice genocida que temos hoje.

O que seria o direito penal, afinal, senão uma fórmula redutora de complexidade, ou então aquilo que Salo de Carvalho chama de método de despedaçamento? (Criminologia e Transdisciplinaridade. In "RBCCRIM", v. 54. SP: RT, 2005, p. 311)"



[1] Conferir SOUZA, Ricardo Timm de. Em Torno à Diferença: aventuras da alteridade na complexidade da cultura contemporânea. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

[2] “(...) a simplicidade das leis constitui uma simplificação arbitrária da realidade que nos confina a um horizonte mínimo para além do qual outros conhecimentos da natureza, provavelmente mais ricos e com mais interesse humano, ficam por conhecer.” (SANTOS, Boaventura de Sousa. A Crítica da Razão Indolente, p. 72.)

[3] Os trabalhos a seguir são suficientes para se chegar a tal conclusão: BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: causas e alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993; HULSMAN, Louk e CELIS, Jacqueline Bernat de. Penas Perdidas: o sistema penal em questão. 2. ed. Niterói: Luam, 1997; ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Em Busca das Penas Perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Revan, 1999.

[4] Sobre os discursus ‘re’, conferir: ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Desafios do Direito Penal na Era da Globalização. In: “Revista Consulex”, ano V, n. 106. Brasília: Consulex, 2001.

[5] “A dita civilização do progresso material, fundada na ciência e na técnica, não pôde realizar, pois, a suposta felicidade ampla, geral e irrestrita, conforme prometera em suas origens históricas.” (BIRMAN, Joel. Mal-Estar na Atualidade. RJ: Civilização Brasileira, 2007, 38)

4 comentários:

Marcelo Mayora disse...

ãããhããnnn

12345 disse...

Bonito surto! Já aguardando o próximo ;-)

disse...

ÊITCHA!!

Juriká disse...

Tens que te cuidar, pois há pessoas com mania repressora contra quem surta... dizem que o hospício é o melhor lugar pra elas, mas não sabem bem explicar como ele funciona; a princípio, dizem que é bem diferente da escola e da universidade e mais diferente ainda dos tribunais... Uns dizem que são Napoleão, outros o Crucificado; têm quem diga que é o Sal-vador - esses nao vivem sem gravatas...
Convenhamos, aqui ao pé do ouvido, como eles não surtaram ainda???